Falhas no procedimento de eleição do agente fiduciário no PL 03/2024
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Cássio Cavalli. Professor da FGV Direito SP. Advogado e parecerista.
CAVALLI, Cássio. Falhas no procedimento de eleição do agente fiduciário no PL 03/2024. Agenda Recuperacional. São Paulo. v. 2, n. 35, p. 1-2, jan./2024. Disponível em: www.agendarecuperacional.com.br. Acesso em:
Para um projeto cuja intuição central de aumentar a participação dos credores na falência assenta na eleição de um administrador judicial (chamado de agente fiduciário pelo PL), é grave a falha de concepção do PL 03/2024 quanto ao procedimento que elegerá o administrador judicial.
Já mostrei aqui no Agenda Recuperacional que a assembleia geral de credores não constitui a técnica legislativa mais adequada para se eleger um administrador judicial na falência.
Neste artigo, chamo atenção para outro ponto, que igualmente demonstra uma falha de concepção: o quórum de eleição do administrador judicial previsto pelo PL 03/2024.
Conforme a redação proposta para o art. 42, parece que a eleição do administrador judicial será considerada aprovada se obtiver votos favoráveis de credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia geral.
É um equívoco estabelecer para esta matéria um quórum de mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia. Este quorum pode facilmente levar a que jamais se eleja um administrador judicial. Porém, como a eleição do administrador judicial ocupa um papel de destaque no procedimento, a não eleição de um administrador levará ou à manutenção do administrador judicial nomeado pelo juiz (o que torna desnecessário todo o procedimento do PL de eleição de um novo administrador judicial) ou a impasses e à reiteração de assembleias e votações.
Para evitar este resultado, a técnica adequada envolve a previsão de um quórum sobre uma base de votos válidos presentes à assembleia, descontados votos nulos e abstenções. Além disso, para assegurar que se eleja alguém, ao invés de adotar-se um quórum de mais da metade dos votos (também chamado de maioria absoluta), deve-se adotar uma maioria simples, isto é, considerar eleito o candidato a administrador judicial que receber o maior número de votos, os quais não precisam corresponder a mais da metade dos votos.
Porém, há outro problema: a assembleia também deverá fixar a remuneração do administrador judicial que elegerá. Como isto será feito? Na mesma votação em que se elege o administrador judicial aprova-se a remuneração que ele mesmo propõe? Ou será fixada noutra deliberação, caso em que o administrador eleito poderá recusar a nomeação e retardar a falência?
Em qualquer caso, como a remuneração do administrador judicial será fixada ou chancelada pelos credores, é despropositada a norma do art. 35, § 2º, que prevê que “A remuneração do gestor fiduciário será fixada de acordo com os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes, com possibilidade de variação de acordo com a taxa de sucesso na alienação dos ativos e no pagamento dos passivos.” Esta norma apenas abre a oportunidade para credores vencidos na deliberação impugnarem o resultado da assembleia, levando à demora e ineficiência no processo falimentar.
As disposições sobre o quórum de eleição do administrador judicial previsto no PL são mais um elemento que aponta para uma falha de concepção do PL 03/2024, a recomendar redobrada cautela do Congresso. Urgência na aprovação do texto encaminhado originalmente positivará disposições incoerentes com o objetivo de aprimorar a falência e levará a mais litígio e demoras no processo falimentar.
De Nova Iorque para São Paulo, 25 de janeiro de 2024.
Cássio Cavalli
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