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As técnicas de organização coletiva de credores para a eleição do gestor fiduciário no PL 03/2024

Cássio Cavalli
Cássio Cavalli
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Cássio Cavalli. Professor da FGV Direito SP. Advogado e parecerista.
CAVALLI, Cássio. As técnicas de organização coletiva de credores para a eleição do gestor fiduciário no PL 03/2024. Agenda Recuperacional. São Paulo. v. 2, n. 33, p. 1, jan./2024. Disponível em: www.agendarecuperacional.com.br. Acesso em:

O PL 03/2024 cria a figura do gestor fiduciário, que nada mais é do que um administrador judicial eleito pelos credores. Por tratar-se de um administrador judicial eleito pelos credores, o PL poderia ter dispensado a nova terminologia e, sobretudo, ter evitado aumentar a complexidade do procedimento falimentar pela inserção de um dispendioso e improdutivo procedimento endofalimentar de eleição, pelos credores, de um administrador judicial.

Este procedimento inicia-se na sentença de quebra, que determinará a convocação de assembleia geral de credores para eleger o substituto do administrador judicial nomeado pelo juízo (art. 99, IX).

A convocação e realização de assembleia de credores é procedimento custoso, despropositado e pouco útil quando o assunto é eleger um administrador judicial. Isto é, não constitui a técnica adequada de organização dos credores para o fim de eleger um administrador judicial, mormente quando comparada com outras técnicas que poderiam ter sido adotadas pelo PL. Vejamos.

Uma assembleia geral envolve custos de locação do local onde será realizada, bem como custos de convocação e organização da assembleia. Desse modo, mal iniciado o processo falimentar, já são impostos custos a diminuir a eficiência do procedimento. Mas e se a massa falida não possuir recursos líquidos para arcar com estas despesas? Dispensa-se a assembleia ou posterga-se sua realização até que a massa possa pagar o aluguel?

Para organizar a assembleia, se terá que organizar não apenas uma lista de credores, mas também será necessário identificar quem se legitimará a comparecer e exercer direito de voz e voto em assembleia, reunindo-se procurações, documentos de identidade etc.

A pauta da assembleia é a eleição do administrador judicial, mas não se sabe quais são os candidatos. Os credores escolherão o administador de algum cardápio? Se sim, como os candidatos se habilitam? Ou será que os candidatos deverão comparecer à assembleia para fazer suas ofertas de prestação de serviços? Ou serão os credores que sugerirão nomes para uma eleição? O administrador judicial nomeado provisoriamente pelo juízo pode se candidatar?

Essas perguntas são altamente pertinentes e demonstram como a adoção de procedimento assemblear para organizar uma eleição pode facilmente descambar para dúvidas, contrariedades e contencioso. O PL não responde a estas questões, nem antecipa inúmeras outras questões altamente práticas que deveria ter antecipado.

Reunir os credores em assembleia sem antes se ter organizado minimamente as alternativas dentre as quais deverão escolher é medida custosa que não levará a resultado algum.

Como resultado, o procedimento assemblerar cairá em descrédito, será prorrogado ou dispensado pela jurisprudência para a imensa maioria dos casos, em mais um exemplo de norma que não funciona e que precisa ser corrigida pelo Poder Judiciário.

Há outras técnicas menos custosas e mais efetivas de organização dos credores que o PL não desenvolveu adequadamente, como a formação de comitê de credores para elaborar uma lista de propostas de administradores judiciaia para que os credores tenham uma nominata para escolher. Além disso, para que realizar uma assembleia geral de credores quando bastaria um artigo no PL que determinasse a abertura de incidente na falência para receber as petições dos credores com as manifestações de voto? A título de exemplo, nos Estados Unidos, país cujo modelo de direito concursal frequentemente é cantado como a referência a ser seguida por nós, brasileiros, vota-se em plano de recuperação judicial pelo correio.

O objetivo de promover uma maior participação dos credores no processo falimentar deve ser perseguido com a adoção de normas que assegurem, ao menos custo possível, a efetiva participação dos credores, o que, parece-me não ser o caso do procedimento previsto no PL 03/2024.

Estas observações recomendam grande cautela do Congresso ao analisar o PL 03/2024. Neste caso, parece que urgência não orna com eficiência.

De Chicago para São Paulo, 23 de janeiro de 2024.

Cássio Cavalli

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